“A educação vem de casa”, diz o antigo provérbio. Mas até que ponto essa afirmação permanece verdadeira? A julgar pelo que se observa cotidianamente, tem-se a impressão de que a sociedade brasileira moderna passou a acreditar que os professores têm a obrigação de ensinar tudo – e, também, de educar as crianças.
Claro que o mestre pode e deve contribuir para que os jovens se preparem para a vida de uma maneira mais abrangente. Transmitir e discutir valores essenciais ao exercício da cidadania, principalmente no tocante aos direitos e deveres de cada um, são procedimentos compatíveis com o exercício do magistério. O que não pode acontecer – mas, infelizmente, tem sido cada vez mais constante – é a “terceirização”, por parte dos pais, daquela que seria a parte mais valiosa de sua missão: o “educar”, com foco na preparação dos filhos para a vida.
É muito importante diferenciar o ensino – atributo da escola – da educação, que é prerrogativa da família. O ensinar é a transmissão e/ou repasse de um conhecimento adquirido anteriormente; o educar vai muito além da transmissão de conhecimentos. É a arte do aprender a aprender. E do saber transmitir. Não se trata apenas de dominar as sutilezas da gramática, as normas da ortografia, os conteúdos formais dos livros e cartilhas. O ensino remete à apropriação e ao desenvolvimento dos saberes e das habilidades técnicas. Educar refere-se ao desenvolvimento da cidadania, ao exercício da vida em sociedade. Mas como se faz isto? Quem são os sujeitos desta ação? O momento que vivemos pede uma urgente reflexão a respeito desses temas.
Muito se tem falado do quanto o ensino no Brasil é deficitário, principalmente no contexto das escolas públicas de ensino fundamental e médio. Embora o acesso à escola tenha sido universalizado nos últimos 20 anos, o que foi muito positivo, esse salto quantitativo não se fez acompanhar de um aumento da qualidade. O desempenho dos estudantes brasileiros nos testes internacionais que auferem o grau de conhecimento em leitura e matemática é pífio. Entre os adolescentes, a evasão atinge patamares alarmantes, e há problemas sérios no que se refere à qualidade dos conteúdos trabalhados em sala de aula e à competência dos profissionais de ensino. Quando, a este quadro, se alia o desinteresse da família, temos o delineamento de um cenário realmente dramático.
Não faz muito tempo, os colégios públicos eram expoentes da mais alta qualidade de ensino no País. Em instituições como o Caetano de Campos, na cidade de São Paulo, as vagas eram concorridíssimas, mais ou menos como acontece hoje nos vestibulares para as universidades federais e estaduais. As escolas particulares eram frequentadas pelos filhos da elite que não conseguiam passar nos famosos “vestibulinhos” dos estabelecimentos de ensino público. E o magistério era a carreira seguida pelas “moças de boa família”, que se orgulhavam do título de “professora”.
Hoje, a despeito de algumas poucas e gloriosas exceções, resta uma desoladora conjunção de experiências pedagógicas caóticas e mal implementadas, de degeneração das infraestruturas, de indefinição de papéis e de desprestígio ao professor – e não estamos falando de salário!
É urgente rediscutir os rumos da Educação e aquilo que se espera do professor, dos pais e – por que não? – das crianças e dos jovens. Uma das prioridades deve ser o resgate do prestígio e do respeito do profissional do ensino. É necessário fortalecer seu papel de mestre, recolocando-o no patamar elevado a que tem direito. Também é fundamental que os pais sejam parceiros da escola e, sobretudo, que permaneçam vigilantes em relação aos filhos, monitorando seu comparecimento, suas notas, a realização das tarefas, as pessoas com as quais se relaciona, os ambientes que frequenta. E, ainda, é mais do que necessário resgatar a finalidade original da escola – que é de ensinar.
Não podemos atribuir responsabilidades isoladas por esses descalabros. As várias instâncias de governo, as instituições de ensino, as empresas e, principalmente, a família, devem assumir suas respectivas responsabilidades. Um problema de imensas proporções como este pede soluções abrangentes, com a participação efetiva de todos.
Cabe ressaltar que a base educacional frágil resulta em uma formação deficitária mesmo para aqueles jovens que conseguem chegar à graduação. Não por acaso, 88% dos bacharéis em Direito que prestaram a prova da OAB em 2008 foram reprovados. Quantos deles jamais exercerão a advocacia, embora tenham investido alguns milhares de reais e anos de estudo neste sonho?
Em praticamente todas as profissões, a formação acadêmica insatisfatória também é fator preponderante para os insucessos, mas não o único. Por desconhecerem o ambiente empresarial, muitos jovens profissionais não conseguem se manter, ou sequer ingressar, em uma organização. Realizar investimentos sociais no campo da educação e abrir espaços para receber e treinar estagiários e jovens aprendizes são exemplos de contribuições que podem ser dadas pelas empresas.
Aos governos, cabe o dever de empreender esforços no sentido de oferecer melhor formação às crianças e adolescentes nas escolas públicas. Não adianta termos investment grade, Pré-Sal e outras vantagens competitivas se o nosso bem mais valioso – o ser humano – não está recebendo os cuidados que merece.
Para que esse momento maravilhoso que vivemos no campo econômico se torne duradouro, é de suma importância formar profissionais qualificados. Somente assim nos manteremos competitivos e capazes de criar e inovar. É a educação de base, com o envolvimento de todos os pilares sociais – pais, governo, escolas, setor produtivo –, que produzirá os agentes do nosso futuro.
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